Rodrigo Bittencourt mostra o lado artístico da política na telona

24 maio 2017 |


Discutir a realidade atual do Brasil de forma artística não é nada fácil. E ainda mais levar às telas do cinema algo que faça o público refletir para possibilitar um futuro melhor para a nação, afinal, apesar de todos os acontecimentos, a vida continua e detemos, enquanto cidadãos, de armas próprias para darmos novos rumos ao país. Assim, o diretor do filme “Real - o plano por trás da história”, Rodrigo Bittencourt, comanda uma das melhores produções, na área, nos últimos anos. E esse bate papo artístico com o público, através da trama, vai ter estreia, em todo o país, no dia 25 de maio. Com bom gosto para seleção de repertórios, Rodrigo também assina a trilha sonora do filme.

Acompanhe a entrevista que ele concedeu, com exclusividade, ao CULTURA VIVA!

CULTURA VIVA: Arte e política andam juntas ou é possível separá-las? 
RODRIGO BITTENCOURT:Totalmente possível separar o joio do trigo. Eu separo Caetano Veloso e José Serra tranquilamente, por exemplo (risos).

C.V.: Até que ponto seu filme “Real” é político?
R.B.: Até o ponto que eu quis deixar ele ser. O que importa pra mim são grandes ideias. Sou um homem de ideias e ideais. Quando Santos Dumont criou o avião ele não sabia que iam pegar a ideia dele e fazer guerras com ela. Uma coisa é a ideia, a outra é o que políticos fazem com ela depois. Geralmente eles estragam as grandes ideias, mas por elas serem grandes, acabam extrapolando esses vampiros e servindo também para boas causas. Assim foi com o real, que extrapolou a tolice entre direita e esquerda e se tornou uma ideia que salvou o país inteiro da hiperinflação.


C.V.: Você também tem uma carreira como cantor/compositor, certo? Como administra suas inspirações, encaminhando elas para o cinema, música, escrita...?
R.B.: Pra mim tudo é escrever. Nasci escrevendo poemas e músicas e tudo pra mim é ritmo. Construo cada cena pensando antes no ritmo delas. Traço um mapa para isso na minha cabeça e assim crio um universo rítmico para todo o filme. 'Pensar é fazer música" 

C.V.: O Brasil, do jeito que está hoje em dia, ainda causa boas inspirações?
R.B.: O Brasil sempre me causa boas inspirações. Precisamos positivar, aprender isso com os Beatles, eles fizeram isso o tempo inteiro... Eu sou um positivista e sou apaixonado pelo meu país que quando deixa um pouco de ser dionisíaco para ser apolíneo, quando conseguimos esse equilíbrio, tudo se resolve, sempre com grandes ideias e grandes soluções!  Ou é melhor falar de outras épocas?
  
C.V.: Lembra qual foi o primeiro filme que viu na vida que te emocionou, a ponto de fazer seguir esta profissão?
R.B.: "Ladrões de Bicicleta", do Vittorio de Sica.

C.V.: Você é um diretor que também faz músicas e escreve, ou um compositor que também faz cinema?
R.B.: Eu não acredito nessas divisões para os artistas e nem para a vida. Sartre dizia muito isso que se você acredita que é alguma coisa, você se torna um escravo daquela crença e não consegue se libertar dela, a ponto de simplesmente repetir a vida toda a mesma personagem. Eu não sou assim. Eu não SOU, eu ESTOU.
Sou de estados. Posso ser hoje diretor e amanhã acordar músico, ou roteirista, ou poeta, ou romancista... Ou um... ladrão de Bicicleta... (risos).


C.V.: Falando em música, o que curte ouvir (nacional e inter)? 
R.B.: Eu vivo com música quase todos os dias da vida. Adoro. Gosto de tudo... Meus preferidos? Beetowen, Bach, Mozart, Tchaikowisk, Hendrix, Jorge Ben, Caetano, Tom Jobim, Nirvana, Lenon, Beatles, Tom zé... Fagner, Fabio júnior... Metallica, Megadeth, Slayer... Nossa, tanta gente... Mosca, Chico César, Lenine... Cazuza, Renato Russo, os Titãs são gênios! Arnaldo Antunes sozinho também é! 

C.V.: E o que não curte?
R.B.: Sandy, Mara Maravilha, Angélica, Tiago Iork... Não gosto de nada muito empoladinho, gosto de coisas reais, que tem sangue na veia...

C.V.: Você veio da zona oeste do Rio, Bangu. Acredita que é um ponto fora da curva? Ou é possível que, cada vez mais, surjam artistas de expressão nacional vindos de subúrbios e periferias do país? 
R.B.: Acredito que eu sou a curva (risos). Espero que sim! Nós trepamos melhor... (risos).

C.V.: O que é preciso fazer para que a arte não seja apenas elitista?
R.B.: A arte não é apenas elitista. Sou um exemplo vivo disso, Seu Jorge é outro e muita gente pobre conseguiu arrebentar e fazer sucesso... Aliás, acredito que a maioria veio dos subúrbios, falando dos músicos. Já o cinema, a maioria dos diretores e diretoras são ricos... Ou possuem famílias com grana. Pelo menos no eixo Rio e São Paulo. A música é bem mais democrática que o cinema. Eu sou dos poucos diretores pobres que conseguiu realmente fazer um filme assim, bem grande. 

C.V.: Dizem que as pessoas não estão indo mais tanto ao cinema, por causa das séries e TV por assinatura. Sente isso também? 
R.B.: Nao sinto. Tivemos mais de 13 milhões de bilhetes em Minha Mãe é Uma Peça 2. O cinema vem crescendo a cada ano. O Brasil está em crise em quase todas as áreas e o cinema só cresce. Ano passado crescemos mais e 15%! 

C.V.: Como o cinema nacional pode resgatar seu interesse com o público, como fez o argentino, por exemplo?
R.B.: Faltam mais salas e falta menos patrulha política. O cinema não pode viver apenas de um lado só, não somos manetas. Ou pelo menos não podemos ser se quisermos crescer de verdade. Falta também o brasileiro parar de detestar seu próprio povo e costumes. Os americanos venderam tudo em seu cinema pro mundo, franceses e ingleses também. E ainda vendem, o cinema argentino começou a fazer isso, nós ainda não. Precisamos de mais filmes internacionalmente conhecidos, precisamos que as distribuidoras e produtores invistam nisso. Ou seja, quanto temos um filme como o Real- o plano por trás da historia, temos aí a chance real com um trabalho com muito esmero técnico de todas as equipes, de concorrer de igual pra igual com qualquer cinema do mundo. É preciso investir em filmes assim e colocá-los em todos os festivais possíveis.

Fotos: Divulgação


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