O fotógrafo que coloca os povos originários no centro de suas lentes desde os anos 80, Renato Soares, é o entrevistado do Provoca desta terça-feira (30/9). Na edição, apresentada por Marcelo Tas e exibida às 22h, Soares relembra seu início na fotografia, compartilha como conquista a confiança de seus fotografados e faz uma crítica aos governantes por não darem poder efetivo aos indígenas.
 

Renato começa o programa citando uma frase de sua amiga e fotógrafa Maureen Bisilliat, sobre a fotografia dele: “você conseguiu fotografar a intimidade dos povos indígenas”; e foi a partir dessa sensibilidade que ele acredita ter nascido a confiança que marca sua relação com as comunidades até hoje. Fazendo menção a esse registro da intimidade, ele relembra uma das fotografias mais marcantes de sua trajetória.
 

Em uma aldeia Krahô, eternizou o último suspiro de uma criança nos braços da avó. “Escorria dos olhos da avó uma lágrima e ela para no ar aqui, e a criança dá o último suspiro. Quando eu revelei aquilo e ampliei, eu vi que no reflexo da gota da lágrima se refletia quase que o ambiente ali. (...) [Isso] me causou uma transformação”, conta. Foi a partir desse momento que Soares decidiu retratar “o que o outro tem de melhor”, já que, segundo ele, a fotografia costuma premiar a dor e a guerra, mas seu compromisso pessoal e profissional passou a ser com a dignidade e a beleza.
 

A arte sempre esteve presente em sua vida. Cresceu em um lar musical, onde a mãe cantava e o pai tocava instrumentos, mas foi aos 16 anos, durante uma viagem com os amigos à Serra da Cantareira, que teve o primeiro contato com a câmera. Ao avistarem o caminhão de uma construtora despejando lixo na Serra, tiveram a iniciativa de registrar para denunciar. “Peguei a máquina e disse: ‘deixa que eu fotografo’”, lembra. Ele ainda revela que esse ocorrido foi o responsável por descobrir sua vocação e o poder da fotografia, já que, mais tarde, a empresa disponibilizou caminhões para fazer um mutirão e recolher lixos, mudando a realidade.


 

No bate-papo, Renato também faz uma crítica aos governantes ao ser provocado por Tas sobre sua frase de que ‘a esquerda, quando chega ao poder, deixa de ser esquerda e se torna apenas poder’. Ele explica que nenhum presidente realmente ajudou o meio ambiente e os povos originários, ainda que, no cenário atual, com Lula como chefe de Estado, houve avanços, mas é necessário mais firmeza: “O governo atual escuta mais, dá voz aos indígenas, mas não deu poder a eles. Dar voz é uma coisa, dar poder é outra. Executar aquelas ações é necessário”.


 

Sobre Renato Soares:

Renato Soares é fotógrafo e documentarista indigenista, com quase 40 anos de dedicação à cultura e à memória dos povos originários do Brasil. Seu primeiro grande contato com as comunidades ocorreu ainda no fim dos anos 1980, com os Xavantes, e pouco depois no Vale do Javari, onde fez a foto que marcaria sua vida: a do menino Matsé submerso na água.
 

Ao longo da carreira, teve imagens publicadas em veículos como National Geographic e Scientific American, realizou exposições em instituições como o MASP e a Caixa Cultural, e publicou livros de referência, entre eles Krahô, os Filhos da Terra (1996), Universo Amazônico (2012) e a coleção contínua Povos Originários, dentro do projeto Ameríndios do Brasil. Parte da renda de seu trabalho é revertida às comunidades retratadas, em um modelo de valorização e sustentabilidade cultural.

 

Foto: Ana Paula Santos


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