Um coreógrafo e uma missão: fazer da Dança uma forma de ocupar o tempo de adolescentes
na comunidade Mata
Machado, no Alto da Boa Vista, no Rio de
Janeiro, e, dessa forma, profissionalizá-los. Essa é a meta, desde 2011, do
carioca Mauricio Guimarães de Souza, mais
conhecido como Maurício Rubão. Em
entrevista exclusiva ao CULTURA VIVA,
o empresário fala um pouco de sua história e como contribui para a cultura no
Estado.
CULTURA VIVA: De onde vem a paixão pela
Dança? Têm históricos na família?
MAURÍCIO RUBÃO: A paixão pela dança surgiu
quando comecei a vir que tinha paciência em ensinar. Todo domingo, à tarde, um
amigo meu ia à minha casa para aprender a dançar comigo e eu o ensinava com
muita paciência. O que aprendia da aula de hip hop que fazia no America Futebol
Clube, na escola “Tocando em Você”, passava para ele. Lá tinha
também teatro e música. Tudo isso me ajudou muito na dança. Em minha família só
uma prima dá aula de Dança Afro, mas quase não a vejo.
C.V.: Ser bailarino no Brasil não é uma
tarefa fácil. Recebeu críticas no início da carreira? Como lidou com a
situação?
M.R.: Quando comecei dançava numa
companhia de um projeto de hip hop e os quatro coreógrafos tentaram viver da
dança e não conseguiram. Quando entrei, em 2005, na CIA, nunca
imaginava viver da dança. Tinha muita dificuldade para pegar os movimentos porque,
de 2003 a 2005, a companhia ganhou oito festivais seguidos e isso me preocupava.
Até que resolvi investir em mim. Na época, dava aula num projeto chamado Jovens
pela Paz (de 2002 a 2005), no Alto da Boa Vista, e ganhava muito pouco dançando.
Sofri muito preconceito porque ninguém acreditava em mim, nem a minha mãe, até
que, quando comecei a ajudar em casa, ao invés de pedir dinheiro da passagem,
ela passou a me apoiar. Eu usava a camisa de uniforme da escola para ir dar
aula de dança. Fazia aulas só com R$ 2, às vezes, no bolso; comprava
tudo de bananada de 10 centavos e ficava o dia todo só com aquele alimento. Como
estudava em Vila Isabel de manhã, ia, muitas vezes, no Restaurante Popular, no Maracanã,
para almoçar porque custava R$ 1. Ficava até as 23h fazendo aula. Até me
emociono ao lembrar isso porque só eu sei o que passei para hoje desfrutar tudo
aquilo que conquistei.
C.V.: Você se especializou em hip-hop e
agregou a ele outros ritmos, como o funk, o charme e o soul, por exemplo. Isso
demonstra seu talento. É fácil juntar tudo isso numa só coreografia? Que
técnica você usa para suavizar o aprendizado?
M.R.: Sim, me especializei em
outros estilos até porque o dançarino tem de ser versátil hoje em dia, deve
buscar sempre autoconhecimento. Por ser coreógrafo, busco inovar e, para mim, é
até fácil porque estou sempre fazendo cursos. Quando vou montar alguma coreografia procuro sentir
a música dançando com o corpo e alma.
C.V.: O projeto social que criou em
2011 chamado Rubão Dance tem beneficiado dezenas de adolescentes na comunidade
Mata Machado, no Alto da Boa Vista, no Rio de Janeiro. Como se sente observando
a evolução desse pessoal?
M.R.: O projeto existe sim desde 2011, passou pela Rocinha
e voltou para o Alto da Boa Vista em 2002, quando eu trabalhava no projeto Jovens
pela Paz, aqui mesmo no Mata Machado. Quando o projeto acabou em 2005 e,
infelizmente, as turmas que eu tinha de crianças e adolescentes com turnos
manhã, tarde e noite, em outra comunidade do Alto, a maioria das meninas
engravidaram quando projeto acabou e vi como aquilo era importante na vida
delas. Na aquela época, o único que seguiu foi o Junnyor Cruz, que hoje se
tornou professor com aulas lotadas no Rio das Pedras, em Jacarepaguá, e me
ajuda no projeto dando aula para adolescentes e adultos. Hoje o projeto tem 60
crianças, com 10 na fila de espera. Vou abrir a terceira turma e
vejo, a cada dia, a transformação na vida delas em casa e na escola. A
ideia do projeto não é só aula e, sim, formar cidadãos, e estou conseguindo.
C.V.: Você dedica seus sábados a ensinar essa garotada e o faz de todo o coração. O projeto tem patrocínios? Que apelo você faz para chamar a atenção de empresários e políticos para a importância da causa?
M.R.: No projeto dou aula porque sou cria da comunidade
do Tijuaçu perto do Mata Machado e sei bem o que é querer fazer aula e não ter
dinheiro. Por isso, ajudo esses adolescentes sem cobrar nada. Financeiramente, a
única coisa que peço é que tenham notas boas na escola, que respeitem os pais e
ao próximo. Infelizmente, não tenho patrocínio no projeto; temos a ajuda das
minhas alunas da Barra da Tijuca que sempre quando preciso de algo, vêm e ajudam
em algo que precisamos.
C.V.: Através da Dança você também
trabalha a disciplina, o profissionalismo e o respeito ao próximo. Tem noção do
legado que deixa para esses adolescentes?
M.R.: Minha ideia no projeto é formar
grandes bailarinas e professoras com respeito e sabedoria, que saibam perder, quando
necessário, e nunca baixem a cabeça frente às dificuldades porque sempre digo para
elas que, através das derrotas que conquistamos as grandes vitórias, e
sem estudo não chega a lugar algum.
C.V.: Que mensagem você deixa para a
juventude?
M.R.: Sempre acreditem nos seus sonhos, procurem realizá-los, nunca
desistam na primeira dificuldade e tenham a certeza de que, mesmo sabendo que muitos
não vão apoiar no começo, se vocês
persistirem, chegarão ao lugar desejado.
Foto: Felipe Fittipaldi
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