Mostra no IMS exibe filmes do L.A. Rebellion, marco do cinema negro norte-americano

31 janeiro 2019 |

A seleção será apresentada no IMS Rio, de 5 a 10 de fevereiro, e no IMS Paulista, de 19 a 23, com debates com pesquisadores e críticos. Cópias em 16 mm e digital, provenientes da UCLA.

Na década de 1970, a Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) iniciou uma política de inclusão étnica, com o intuito de diversificar seu quadro de alunos. Nesse contexto, estudantes afro-americanos ingressaram no curso de cinema, onde produziram filmes inovadores, que questionavam a indústria de Hollywood, trazendo as narrativas negras para o centro da cena. Este amplo conjunto foi designado pela crítica, posteriormente, como L.A. Rebellion. Parte dessa produção pode ser assistida na mostra que o Instituto Moreira Salles apresenta, no mês de fevereiro, em São Paulo e no Rio de Janeiro.

A seleção será exibida no IMS Rio, de 5 a 10 de fevereiro, e no IMS Paulista, de 19 a 23. A mostra reunirá 14 títulos, produzidos principalmente entre as décadas de 1970 e 1980. São curtas, médias e longas exibidos em cópias em formatos digitais ou em 16 mm, cedidas pelo arquivo da UCLA. A curadoria da mostra é de Luís Fernando Moura, pesquisador e programador de cinema, e de Victor Guimarães, crítico, curador e professor.

A programação inclui debates e apresentações de críticos e pesquisadores. No IMS Rio, por exemplo, no dia 9 de fevereiro, às 17h30, haverá um debate com Josslyn Luckett, docente do departamento de cinema da universidade de Nova York, Janaína Oliveira, professora do Instituto Federal do Rio de Janeiro, o crítico Juliano Gomes e Mário Vieira da Silva, colaborador de cineastas da L.A.Rebellion. Eles conversarão sobre os diálogos entre as obras da L.A. Rebellion e o cinema contemporâneo. O mesmo tema também será debatido no IMS Paulista, no dia 23 de fevereiro, às 18h, pelo crítico Heitor Augusto e a jornalista Mariana Queen Nwabasili.

A mostra exibida no IMS inclui títulos de nomes célebres, como Charles Burnett (vencedor de um Oscar honorário em 2018) e Julie Dash (primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem estreado comercialmente nos EUA), além de outros menos conhecidos, como Zeinabu irene Davis, Alile Sharon Larkin, Haile Gerima, Larry Clark e Billy Woodberry. Compromissados com um projeto de cinema autônomo, eles construíram suas obras na UCLA, em um contexto ainda marcado pelas tensões das lutas pelos direitos civis.

Segundo os curadores, os diretores buscavam novas formas de representação, produzindo um cinema que fosse voltado para o público negro. “Contra o que, exatamente, eles se rebelavam? Em primeiro lugar, contra o quase século de imagens que os precedia, esse espelho embaçado de Hollywood em que, na maioria esmagadora do tempo, negros e negras não podiam se reconhecer. Era preciso inaugurar um outro ambiente cinematográfico, próximo às sensibilidades e aos desejos que surgiam das comunidades afro-americanas”.

Realizados sempre com orçamentos mínimos, os filmes eram produzidos de forma colaborativa. O cineasta Charles Burnett, por exemplo, atuou como roteirista, fotógrafo e operador de câmera em várias obras dos seus colegas. “Os créditos dos filmes revelam como essa produção era oriunda de um fazer em comunidade, no sentido mais simples e poderoso da palavra”, reiteram os curadores.

Ainda que com tramas e estilos distintos, os diretores tocavam em pontos em comum, como a busca de uma identidade negra autônoma, presente em Diário de uma freira africana (1977), de Julie Dash, ou Seus filhos voltam pra você (1979), de Alile Sharon Larkin; a crônica do cotidiano no gueto, retratado em Bush Mama (1979), de Haile Gerima; ou ainda a referência aojazz norte-americano, em Dando um rolê (1977), de Larry Clark. Em suas obras, eles também dialogavam com os cinemas modernos produzidos na África e na América Latina, em busca de um novo olhar que se opusesse aos modelos coloniais.

No conjunto de filmes que compõe a L.A. Rebellion, também se destaca a produção das cineastas, cujas obras questionavam os estereótipos associados à figura da mulher negra. No longa-metragem Mulher africana, EUA (1980), por exemplo, a diretora Omah Diegu se inspira em sua própria trajetória para contar a história de uma imigrante nigeriana que luta para sustentar sua filha. A diretora Zeinabu irene Davis, por sua vez, constrói uma reflexão sobre o corpo feminino no curta Ciclos (1989).

Esta seleção evidencia trabalhos que, ainda que pouco conhecidos pelo público, se tornaram uma grande referência para a produção contemporânea. “Poucas vezes na história existiu, até nossos dias, um conjunto tão vigoroso de filmes feitos de preto para preto, de preta para preta, e que se afirmassem com tamanhas altivez e independência. Os filmes dessa geração jovem e talentosa representam um tesouro dos mais valiosos para o presente e o futuro do cinema”, afirmam os curadores.


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