Negueto Rapper e a melodia que embala uma vida de conquistas promissoras

27 novembro 2023 |

 



Ele teve uma infância em que conviveu com realidades bem cruéis. Viu muita coisa e não podia relatar nada. Presenciou cenas que, quando muitas crianças viajavam e desfrutavam da fortuna de seus pais, ele foi obrigado, por circunstâncias da vida, a aprender lidar com a luta, a dor e o sofrimento do outro. Durante sua vida numa comunidade, em São Gonçalo (RJ), conheceu muita gente guerreira que lutou e sobreviveu as intempéries.

 

Quando a vida virou para ele e o desafiou com a imperatividade... “Agora chegou a sua vez!”... Então, decidiu reunir todo aquele contexto para mudar o seu futuro e vislumbrar a sua fé. Foi para a faculdade e, hoje, é um advogado especialista em Direito Imobiliário.

 

E não para por aí. A arte o pegou de jeito e, a partir da afeição com músicas gospel no estilo Rap, encontrou seu próprio gênero. A vida o inseriu em bandas musicais, o preparou e, hoje, apresenta ao público um dos melhores Rappers do estado do Rio de Janeiro... Negueto Rapper – um orgulho em ser humano que exala a melodia que promove modificações para muita gente!

 

Hoje, o artista conversou com o CULTURA VIVA e relatou um pouco de sua jornada até aqui. Que honra!

 

Acompanhe! 

 

CULTURA VIVA: Em sucintas palavras, como o Rap chegou em sua vida? Qual a sua relação com esse estilo?

NEGUETO RAPPER: Primeiramente, Deus me escolheu para ser porta-voz de verdades. Tive toda minha raiz fincada no Evangelho, em cultos semanais, em congregações evangélicas. O Rap encantou os meus ouvidos com o sucesso "Cachimbo da paz", do Rapper Gabriel o Pensador, em 1997, sendo um estouro nas rádios cariocas e uma das primeiras críticas sociais delatoras. O sistema que denunciava o falso moralismo das autoridades e que, de certa forma, sublimava, conseguiu espaço. No mesmo ano já ouvia a rádio Gospel FM, da Igreja Renascer em Cristo, liderada pelo Apóstolo Estevam Hernandes e a Bispa Sonia Hernandes, onde tocavam rappers, como Pregador Luo, da banda Apocalipse 16, ao qual possuo uma tatuagem no braço esquerdo de grupos, como RDJ, por exemplo, e, outra vez fora do contexto religioso, o grupo Racionais Mcs, com a música Negro Drama. Em 2013, me mudei para São Paulo com o intuito de atuar como baterista, mas fui parar no salão 100”, onde conheci, pessoalmente, algumas celebridades e fui convidado a integrar, como Back Vocal, o grupo de rap “X da questão”, em Sorocaba, que abria 30% dos shows dos racionais Mcs e o grupo Gangsta Realidade Cruel, com público equivalente a 14 mil pessoas. Ao terminar a temporada de shows, escrevi minha primeira letra, chamada Alívio, aprovada pelo grupo, com participação da cantora Deborah Pinheiro, lançada no meu álbum Acredita, lançado no ano de 2015. A minha relação com o rap é que sempre ouvi de tudo, mas não tinha esclarecimento acerca de política, geografia, diversidade cultural, poesia e militância, temas que só fui aprender ouvindo rap, e descobri que poderia me expressar verdadeiramente com a arte e colocar para fora tudo o que eu via e ouvia, como indivíduo de maneira expressiva e realista, sem mimimi.

 

C.V.: A música, em si, sempre te motivou? Dedicar seu tempo a ela reflete algo de especial para você?

N.R.: Sempre ouvi música: Michael Jackson e suas batidas, as bases pesadas, a soul music, os sucessos lançados pela gravadora Motown. Eu queria entender como tudo aquilo era possível. Ouvia Fat Family e compus a minha primeira canção, aos 13 anos, inspirado pelo Fat Family, com a música Eu não vou não. Dedicar o meu tempo me resignifica, pois me sinto inserido, útil e consagro a minha representatividade na forma de ser. Nós, negros, sempre fomos pioneiros em tudo, principalmente relacionado ao tipo de arte e à criatividade no meio social. Porém, pouco reconhecidos. Por causa disso é que os nossos ancestrais trouxeram para o mundo tudo quanto é tipo de som, arte e estilo que influenciaram várias nações e artistas, até os dias de hoje.


 

C.V.: Suas letras retratam a realidade social de muitos jovens que vivem em comunidade. Isso seria uma forma de dar voz a eles?

N.R.: Eu me preocupo muito com o que escrevo e canto, pois trago uma bagagem pesada de um passado, de um povo sofrido, lá do Morro do Feijão, comunidade que nasci, em São Gonçalo, e, simplesmente, relato o que vi, li, ouvi e vivi naquela quebrada. Não tinha como cantar outra coisa, pois nosso povo sempre cantou o que viveu. É lamentável hoje os MCs que só pregam ostentação, carros luxuosos, bebidas e cigarros na mão, imitando os americanos que, na verdade, vivem em um outro contexto social, bem diferente do nosso, aqui no Brasil, e sem falar nas muitas letras gringas que, apesar da batida pesada, só falam merda.

 

C.V.: Em sua opinião, como os governantes e grandes empresários podem colaborar para uma vida mais digna para estes jovens e adolescentes, com uma educação de qualidade e plano de carreira profissional?

N.R.: Acredito que a manutenção e a ampliação dos programas de fomento e incentivo à equiparação nos mecanismos que visem afastar a desigualdade social, já na fase inicial dos bebês de comunidades pobres, eliminando a fome por completo, trazendo mais saúde e educação, livros, mais inteligência emocional, menos inteligência artificial para que mentes não se tornem vazias e, não só o filho dos grandes magnatas tenham ensino de qualidade, pois enquanto seus filhos vão para Disney, crianças pobres com os pés descalços vagam pelas vielas  e becos das favelas apreciando o porte de armas e a devastação que a droga já causa no período gravídico de uma mãe.

 

C.V.: Por que decidiu estudar Direito, um dia? Qual a sua especialidade?

N.R.: Quis a virada de chave como diferencial dos meus demais colegas, amigos e parentes de comunidade, e almejei ser perseguido pelos sonhos e não mais por viaturas; não ser mais um daqueles meninos a sentar no banco dos réus e estar do lado de lá do sistema, não por me achar melhor, mas capaz. Todos os meus interesses na faculdade de Direito foram meramente premeditadas e intencionais nas matérias que dizem respeito a questões sociais, como  o direito à vida, à saúde, à  dignidade da pessoa humana inseridas em três dos ramos que mais me chamam atenção, como o Direito Imobiliário, que possui relação direta com a moradia dentro do escopo constitucional no Brasil, com milhões de sem teto; Direito Criminal e Criminologia, que pode ser prolatada, combatendo as violências , os abusos e as violações  cometidos pelo poder público  contra negros e pobres que, estando  longe dos grandes holofotes, são exterminados por um grupo genocida em um pais que mais mata negro no mundo,  pois favela é o lugar onde o couro come todo dia  e ninguém nunca sabe nada, e nada vê.

 

C.V.: O Direito te ajuda a entender melhor estas questões sociais que transmite em suas letras?

N.R.: A Universidade de Direito e o seu instituto, dentre suas teorias hermenêuticas e históricas, não só me ensinaram o motivo do mundo ter vivenciado e praticado o holocausto, por exemplo, na Alemanha, e o racismo em todo mundo, como me esclareceu o que é viver em uma sociedade que não tem direitos. As constituições outorgadas e promulgadas, em vários países, denotam a grande falácia que os poderosos se apropriam para, de forma muito inteligível, neutralizar a eficácia do meio. O Direito não só me ensinou os mecanismos de defesa, mas quem são os dedos que movimentam as marionetes. Eu ainda não deixei de ser marionete, pois dentro de uma filosofia, quase todos nós somos controlados. Mas, hoje, sou a marionete que observa os dedos de quem movimenta nos bonecos, e luto para me desprender destas cordas de forma mais inteligível e ainda, nos tempos de hoje, sou obrigado a ser um jurista que não só fala de Direito, mas lardeia a ausência dele na nossa sociedade.

 

C.V.: Para 2024 prepara algo de novo para seu público?

N.R.: Como ainda não sou totalmente livre, estou trabalhando em uma das duas músicas bem comerciais, de acordo com o cenário atual do TRAP (subgênero do rap). N[ão era o tipo de letra que eu gostaria de cantar, mas é a única forma de ser visto e abrir portas porque o meu estilo predileto é marreta. Mas, estou tendo a honra de lançar músicas com versos de poetas do município de São Goncalo, como Décio Machado, J C Gomes e outros que estão surgindo nesse EP chamado ‘Prosas In Rap”, com selo de Tudo pela Arte e apoio da Atriz , cantora e escritora Ligia Carvalho, e Dom Sarau.


 

C.V.: Quais são as suas redes sociais?

N.R.: Minhas redes sociais são: 

https://www.tiktok.com/@negueto_?_t=8hX4RD0O5ll&_r=1

https://instagram.com/negueto_rapper?igshid=M2RkZGJiMzhjOQ== 

https://youtube.com/@neguetoRapperRap?si=SNtkJADJ9tZrYfst

 

Fotos: Divulgação

 


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